Guerra comercial leva exportações a terem o pior resultado na década
Jamil Chade
01/10/2019 06h12
GENEBRA – A guerra comercial lançada por Donald Trump cobra seu preço e afeta exportadores de todo o mundo. Nesta terça-feira, a OMC publicou suas projeções para as exportações em 2019 e foi obrigada a rever de forma dramática suas expectativas, inclusive para 2020.
Os resultados, que levam o desempenho do comércio mundial para perto de uma estagnação, revelam a dificuldade que o Brasil e outros emergentes podem encontrar para relançar suas economias com base nas exportações.
A estimativa da OMC em abril de 2018 era de que, para 2019, a expansão fosse de 4%. Em setembro daquele ano, ela já havia sido revista para 3,7%. Em abril de 2019, uma nova previsão apontou para uma expansão de apenas 2,6%. Agora, a perspectiva é de que a expansão seja de apenas 1,2%, a menor desde o início da década e da crise financeira internacional entre 2008 e 2010.
Se confirmada, a expansão é a terceira pior nos últimos 30 anos.
Uma volta do crescimento apenas ocorreria em 2020 e, mesmo assim, com uma expansão pequena. A OMC previa que o crescimento no próximo ano seria de 3%. Mas também reduziu a projeção para apenas 2,7%.
Já em fevereiro, os dados mensais do comércio apontaram para o pior resultado em nove anos. A OMC admite que grande parte da tensão vem do confronto entre China e EUA, que aplicaram tarifas mútuas no valor de US$ 350 bilhões. Em todo mundo, as barreiras atingiram US$ 481 bilhões, seis vezes o volume registrado um ano antes.
Roberto Azevedo, diretor-geral da OMC, alertou sobre a situação. "A perspectiva negativa do comércio é desencorajadora, mas não inesperada", disse. "Além de seus efeitos diretos, os conflitos comerciais aumentam a incerteza, o que está levando algumas empresas a atrasar os investimentos que aumentam a produtividade e que são essenciais para elevar os padrões de vida", afirmou.
"A criação de empregos também pode ser dificultada à medida que as empresas empregam menos trabalhadores para produzir bens e serviços para exportação", disse.
"Resolver disputas comerciais permitiria que os membros da OMC evitassem tais custos", acrescentou o diretor-geral. "O sistema de comércio multilateral continua sendo o mais importante fórum global para resolver diferenças e fornecer soluções para os desafios da economia global do século 21. Os membros devem trabalhar em conjunto num espírito de cooperação para reformar a OMC e torná-la ainda mais forte e eficaz", defendeu.
Os novos números têm como base uma revisão da expectativa de expansão do PIB mundial, de 2,6% para 2,3%. Na visão da OMC, além das tensões comerciais, pesam fatores como a incerteza do Brexit e situações específicas em diferentes economias.
Pode piorar
Diante do elevado grau de incerteza, a entidade também aponta que o crescimento do comércio em 2019 poderia variar entre 0,5% e 1,6%. Mas se a guerra comercial se intensificar ainda mais, a expansão poderia ficar abaixo de 0,5%. "Mais uma rodada de tarifas e retaliações poderia produzir um ciclo destrutivo de recriminação", alertou.
Na primeira metade de 2019, o comércio de bens registrou uma expansão de apenas 0,6%. Nos países ricos, o aumento foi de meros 0,2%, contra 1,3% nos emergentes. No que se refere às importações, os emergentes registraram uma contração de 0,4%.
América do Sul
O melhor resultado em termos de exportação virá da América do Norte. Ainda assim, com um crescimento de apenas 1,4%, contra 1,3% na América do Sul e 0,7% na Europa e Ásia.
As exportações de commodities também perderam força e os preços registravam, em agosto, uma queda de 12% em comparação ao mesmo período de 2018.
No que se refere às importações, porém, a América do Sul registrará uma contração de 0,7%, o pior resultado do mundo e, em parte, reflexo da falta de crescimento da economia brasileira.
Sobre o autor
Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.
Sobre o blog
Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)