Brasil abre processo na OMC contra açúcar indiano
Jamil Chade
15/08/2019 09h08
Entidade máxima do comércio ainda alerta para freio nos fluxos comerciais e previsão de perda de força das exportações nos próximos meses.
GENEBRA – Numa disputa que promete causar atritos entre dois dos principais membros dos Brics, a Organização Mundial do Comércio (OMC) aprovou nesta quinta-feira o início de um processo contra os subsídios dados por Nova Deli aos produtores de açúcar do país.
O Brasil havia feito o pedido, depois de se queixar de que irregularidades na forma pela qual os indianos subsidiam o setor. Os dois países que, por anos foram aliados na defesa de pautas das economias emergentes, hoje estão cada vez mais em lados opostos no comércio.
Em nota, o governo indicou que "a Índia tem intensificado sua política de apoio ao setor açucareiro".
"Desde a safra de 2010/2011, o governo indiano praticamente dobrou o preço mínimo a ser pago pela cana-de-açúcar. Apenas entre as safras de 2017/2018 e 2018/2019, o volume de açúcar a ser exportado pelas usinas indianas, definido pelo governo daquele país, passou de 2 milhões para 5 milhões de toneladas", alertou.
"No entendimento do Brasil, essas medidas têm contribuído fortemente para a depreciação do preço internacional do açúcar, em prejuízo dos exportadores brasileiros", alertou o governo brasileiro.
"Na avaliação brasileira, ademais, tais medidas são incompatíveis com as disciplinas do Acordo sobre Agricultura da OMC, seja porque ultrapassam os níveis de apoio doméstico permitidos à Índia, seja porque constituem subsídios à exportação vedados pelo Acordo", apontou.
A ideia do Brasil, porém, era a de unir forças com Austrália e Guatemala, que também entraram com um caso contra os indianos. Mas o país asiático se recusou a aceitar que as três queixas fossem unificadas.
Na prática, isso deve levar os casos a se arrastarem por meses, evitando uma eventual correção na política indiana de subsídios.
Queda ainda mais acentuada
Nesta quinta-feira, a OMC ainda confirmou os temores de que a atual guerra comercial poderá ter um amplo impacto no fluxo de bens em 2019. Em sua avaliação trimestral, a entidade apontou como há uma "perda" de força no comércio, confirmando a tendência que já era registrada desde o começo do ano.
Os indicadores da entidade apontam que essa perda de vitalidade do comércio deve "persistir nos próximos meses".
As quedas no transporte aéreo e no fluxo de componentes eletrônicos foram as mais fortes, assim como a produção de veículos, ordens de exportação e mesmo a venda de material agrícola.
Em julho, o diretor-geral da OMC, Roberto Azevedo, já havia alertado sobre o fato de que as novas restrições comerciais impostas por EUA e China estavam em padrões inéditos. "Tensão que conduz a novas barreiras comerciais e maior incerteza geram um risco significativo para a previsão comercial", alertou a OMC, nesta quinta-feira.
Sobre o autor
Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.
Sobre o blog
Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)