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OIT pede que Brasil volte a examinar impacto da reforma trabalhista

Jamil Chade

19/06/2019 08h44

Brasil respondeu com uma ameaça e dizendo que entidade precisa ser reformada
GENEBRA – A OIT pediu ao governo brasileiro para que faça um exame do impacto da reforma trabalhista de 2017 e que adote eventuais mudanças, se necessário. A entidade também recomendou que, em coordenação com trabalhadores e empregadores, o governo prepara um informe para ser apresentado aos peritos da entidade internacional.

Esses foram os resultados da avaliação realizada pela entidade e que, em resumo, pede que o governo retome o diálogo com os atores sociais e sindicatos sobre a reforma trabalhista, questionada.

A entidade examinava as suspeitas de que o Brasil teria violado direitos dos trabalhadores ao aprovar as reformas. Na semana passada, o blog revelou que o Brasil entrara na "lista suja" de 24 países que são examinados por suspeitas de desrespeitar as convenções internacionais do trabalho. No centro do debate está a Convenção 98 da OIT, violações sobre negociações coletivas e, claro, a reforma trabalhista de 2017.

No texto, o Comitê de Padrões da OIT recomenda ao governo que "continue a examinar, em cooperação e consultas com as organizações de trabalhadores e empregadores, o impacto da reforma e que decida, se necessário, adaptações apropriadas".

O Comitê ainda sugere que o governo "prepare, em consultas com empregadores e trabalhadores, um informe a ser submetido" à OIT.

Ameaça

Bruno Dalcolmo, secretário do Trabalho, respondeu com um discurso que foi interpretado como uma ameaça por parte de representantes da OIT em Genebra. Segundo ele, essa conclusão mostra "como é urgente" uma reforma do sistema. Sua principais queixa é de que as decisões sobre governos são tomados por trabalhadores e empregadores, sem o envolvimento das autoridades.

"Nenhum outro sistema da família da ONU é tão fora de contato com a realidade como esse", acusou. Ele ainda disse que o Comitê da OIT não é "democrático, transparente e nem imparcial", e insistiu que seu trabalho não seria sólido.

O secretário ainda destacou como houve um número maior de apoio ao Brasil que aqueles que o questionam e insistiu que o sistema é "importante demais para ser deixado à pressão política".

Numa frase que soou como uma ameaça, o secretário deixou claro que "há limites" para a participação do Brasil se o diálogo não for estabelecido. E ainda completou: se tal sistema continuar, o governo se reserva o direito de manter "todas as opções" sobre a mesa.

Na diplomacia, essa frase é usada quando um governo quer dar um recado de que poderia romper com a organização ou pelo menos sair de alguns de seus mecanismos.

Já fora da sala de reuniões, o secretário ouviu de interlocutores sugestões sobre como o governo deveria organizar consultas públicas com atores sociais. Mas também deixou claro que o governo não teria qualquer intenção de rever medidas adotadas e a estratégia é a de implementar a reforma de 2017, nas diferentes normativas.

Ao terminar o encontro e questionado por jornalistas, Dalcolmo negou que tenha feito uma ameaça. "Não avaliamos sair da OIT e de um comitê", garantiu. "O que temos questionado a OIT é em seu sistema de supervisão", explicou. "Nós vamos sempre cooperar com a organização", insistiu.

Ao ser perguntado sobre o que significaria a frase que ele leu sobre o fato de "todas as opções estarem sobre a mesa", ele não explicou. "Nós não temos um posicionamento neste momento. Entendemos que houve um grande avanço na forma com a OIT tratou o Brasil, e a recomendação é natural na discussão de política públicas", disse.

Antônio Lisboa, secretário de Relações Internacionais da CUT, afirmou que o discurso e a ameaça havia sido "um blefe". "Por mais que eles queiram, não vão sair", disse.

"O governo vem fazendo, desde o ano passado, é um ataque sem precedentes ao multilateralismo e ao OIT. O que querem? voltar a período antes da guerra?", questionou.

O representante da CUT concluiu que a recomendação da OIT não é satisfatória, já que uma das opções poderia ter sido a de pedir que o Brasil adaptasse suas leis ou mesmo declarasse a reforma como uma violação das convenções. "Mas ela reforça o que tanto os trabalhadores como o comitê de peritos disseram: não houve dialogo social para aprovação da lei e fere convenção 98".

Para o sindicato, o que a OIT fez foi manter o Brasil no alvo de um exame internacional.

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Sobre o autor

Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.

Sobre o blog

Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)


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