Partidos alemães atacam Bolsonaro por comentários sobre origem do nazismo
Jamil Chade
04/04/2019 11h53
O presidente Jair Bolsonaro e o chanceler Ernesto Araújo durante visita a Israel (Heidi Levine/Pool/AFP)
Para deputada do partido que faz parte da aliança no poder, Bolsonaro usa "estratégia de mentiras". Já o partido Die Linke chama o brasileiro de fascista.
GENEBRA – Alguns dos partidos mais tradicionais da história da Alemanha pós-Hitler atacam o presidente Jair Bolsonaro por seus comentários sobre a origem do nazismo.
Nos últimos dias, o chefe de estado declarou que o nazismo tinha suas origens nos movimentos de esquerda na Europa, versão também declarada pelo chanceler Ernesto Araújo.
Ao blog, a deputada do Partido Social-Democrata (SPD) Yasmin Fahimi não poupou críticas ao brasileiro. "Os nazistas também usaram o termo 'social' como uma máscara para seu real programa político", disse Fahmi, que faz parte do Comitê de Relações Exteriores do Parlamento alemão.
Seu partido governou a Alemanha sob a gestão de Gerhard Schroeder, Helmut Schidt e Willy Brandt. Hoje, o SPD também faz parte da coalizão que governa a Alemanha, num acordo com o partido de Angela Merkel, de centro-direita.
Qualquer tipo de iniciativa por parte do governo em matéria de relações exteriores também passa pelo SPD. Hoje, o ministro das Relações Exteriores da Alemanha é Heiko Josef Maas, justamente do Partido Social-Democrata.
"O fato de Jair Bolsonaro estar usando a mesma estratégia de mentiras é uma ridicularização inaceitável das vítimas que foram mortas pelos nazistas", disse Fahimi.
"Durante a Alemanha Nazista, foram os sociais-democratas que foram presos e mortos, antes de mais nada", afirmou. "Nazistas foram demagogos fascistas de extrema-direita. Durante esse período, a Alemanha foi uma ditadura fascista, desumana e de ideologia racista. A declaração de Bolsonaro deprecia a memória de todas as vítimas assassinadas pela violência dos nazistas", insistiu.
"O movimento de esquerda, pelo contrário, lutou pela liberdade e pela igualdade de todos. Isso é o oposto do fascismo", completou.
Heinz Bierbaum, chefe do Comitê Internacional do partido Die Linke, tampouco poupou críticas. "Bolsonaro pode ser chamado de fascista", disse. "Desprezando a democracia, as conquistas do Estado de Direito, ele ataca esquerda, LGBT, povos indígenas, afro-brasileiros, minorias e ativistas", declarou.
"A esquerda de todo o mundo se levanta contra Bolsonaro e todo seu ódio", disse. "A história da Alemanha e o surgimento do Partido Nazista nos ensinam a resistir a ameaças do racismo e intolerância em sua origem", atacou o deputado.
Segundo ele, a declaração de Bolsonaro sobre a origem do nazismo é "uma completa distorção dos fatos históricos". "Sem qualquer dúvida, o nazismo é um movimento fascista. Eles não foram responsáveis apenas pela morte de 6 milhões de judeus, mas também de 20 mil membros de partidos de esquerda", declarou.
"Mais de 3 milhões de prisioneiros soviéticos morreram nas prisões na Alemanha durante a guerra", insistiu, lembrando que a ofensiva nazista no mundo e sua ideologia anticomunista deixou como resultado 65 milhões de mortos.
"A esquerda foi parte da resistência antifascista em toda a Europa e lutou contra esses regimes desumanos", completou.
Sobre o autor
Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.
Sobre o blog
Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)