Projeto de lei quer reduzir poder do Estado de decretar sigilo sobre dados
Iniciativa prevê possibilidade de recursos e está sendo apresentada depois da revelação feita pelo blog sobre como o Itamaraty vetou o acesso a documentos sobre suas novas diretrizes de política externa.
GENEBRA – Depois que o Itamaraty vetou o acesso aos documentos que justificam as bases de sua nova política externa, um projeto de lei está sendo apresentado nesta segunda-feira no Senado, propondo mecanismos legais para contestar o sigilo. O objetivo é o de garantir acesso a informações do Estado e permitir que uma eventual recusa em garantir transparência possa ser alvo de um recurso.
No início de setembro, o blog revelou como entidades da sociedade civil foram impedidas de ter acesso aos documentos do Ministério das Relações Exteriores que orientavam uma nova estratégia diplomática do país. Numa reviravolta da posição do Estado brasileiro, o Itamaraty passou a instruir seus diplomatas a vetar termos como "igualdade de gênero", "educação sexual" ou "direitos reprodutivos" em debates e resoluções da ONU.
Numa busca por entender a motivação de tal decisão, grupos de ONGs passaram a pedir o acesso às instruções enviadas pelo governo a suas missões pelo mundo, o que foi negado. O Itamaraty justificou que tal decisão afetaria negociações das quais o Brasil estaria envolvido, além de ameaçar até mesmo a segurança nacional.
O que chamou a atenção das ONGs, porém, foi o fato de que o sigilo foi imposto sobre os documentos depois que as entidades tinham feito o pedido para ter acesso às informações.
Agora, um projeto de lei liderado pela senadora Leila Barros (PSB-DF) quer que a lei 12.527, de 18 de novembro de 2011, seja modificada para permitir que se apresente um recurso contra a classificação de informação por parte do Poder Executivo.
O novo texto incluiria o seguinte parágrafo:
"Art. 30-A. Cabe recurso, por qualquer pessoa ou instituição, contra a decisão administrativa ou política que classifica uma informação nos termos do art. 27 desta Lei, no prazo de dez dias a contar da data da ciência dessa decisão.
§1o O recurso terá por objeto apreciar o cumprimento, pelo agente público que tenha adotado a decisão administrativa ou política, das regras estabelecidas nos arts. 23 e 24 desta Lei.
§ 2o O recurso será apreciado pelo órgão do Poder Judiciário competente para o julgamento do agente público que tenha determinado o sigilo da informação e sua natureza, nos termos da Constituição".
Ao justificar sua ação, a senadora explicou que, "em um país democrático, como é o Brasil da Constituição de 1988, a regra, quanto ao acesso às informações públicas, deve ser a da publicidade". Em sua proposta, a lei que regula a classificação de informações deve contemplar a "hipótese de revisão judicial de tal decisão política ou administrativa".
Caso o sigilo imposto seja realizado pelo presidente da República, caberá ao Supremo Tribunal Federal julgar um eventual recurso. "O mesmo ocorrerá no caso de a decisão ser de um Chefe de Missão Diplomática de caráter permanente, nessa condição", explicou.
Nos últimos dois meses, as decisões tomadas pelo Itamaraty em seus votos na ONU surpreenderam países democráticos e a sociedade civil. A nova postura acabou levando o Brasil a votar resoluções internacionais da mesma forma que fazem regimes autoritários ultraconservadores, como a Arábia Saudita, Egito ou Bahrein. Até agora, o governo não deu uma resposta sobre o que motivou a mudança de postura internacional.
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