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Jamil Chade

Por comércio, Noruega e Suíça exigem que Brasil cumpra obrigação ambiental

Jamil Chade

17/08/2019 04h00

(Getty Images)

 

GENEBRA – Depois da UE exigir que um capítulo ambiental fosse incluído no acordo comercial com o Mercosul, agora é a vez da Suíça, Islândia e Noruega colocar o mesmo critério para fechar um tratado com o Brasil.

A partir da próxima semana, o Mercosul se reúne com os governos da Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA) que reúne Islândia, Noruega, Liechtenstein e a Suíça, para o que pode ser um momento decisivo do acordo. O bloco é formado por economias que não fazem parte da UE e, portanto, ficariam de fora de um fluxo privilegiado de comércio com o Mercosul.

A negociação que ocorre em Buenos Aires, porém, ocorre num momento de tensão entre Brasil e Noruega. Oslo suspendeu o repasses para o Fundo Amazônia, diante das políticas ambientais de Jair Bolsonaro e dos índices de desmatamento.

O presidente brasileiro menosprezou o corte e rebateu a decisão da Noruega, insinuando que Oslo estaria "de olho" na Amazônia. Entre os países europeus, porém, fica claro que o compromisso ambiental não irá desaparecer. "Como em todos nossos acordos, o processo com o Mercosul irá conter um capítulo completo sobre comércio e desenvolvimento sustentável, incluindo medidas sobre a gestão sustentável de florestas", disse o governo da Suíça, num email à reportagem do UOL.

"Esperamos que o Brasil honre suas obrigações internacionais", declarou Berna, numa referência a tratados como o Acordo do Clima de Paris e outros compromissos.

Os dois blocos iniciaram as negociações em 2015. Mas foi apenas em 2017 que houve uma decisão política de que um entendimento deveria ser atingido. Nesse mesmo ano, o comércio entre os blocos superou US$ 8,7 bilhões, apontam dados da EFTA. Ao bloco dos quatro países europeus, o Brasil exportou 1,9 bilhão de euros em 2018 e importou 2,6 bilhões de euros no mesmo ano.

Produtos agrícolas, alimentos, café e partes de aeronaves estão entre os principais itens da exportação do Brasil para os mercados do EFTA.

Temor

Se os europeus insistem que o assunto ambiental é fundamental no novo acordo, os suíços estão conscientes de que podem perder ficando de fora de um tratado com o Mercosul.

Hoje, produtos suíços, noruegueses e da UE sofrem as mesmas tarifas para entrar no bloco sul-americano. Mas com a redução de impostos acertada com a UE, a consequência do acordo seria a de prejudicar os produtos suíços e noruegueses. Enquanto uma máquina alemã entraria no Mercosul isenta de tarifas, o mesmo produto suíço teria de pagar uma taxa de 20%, o que simplesmente o tiraria do mercado.

Não por acaso, a ordem entre os diplomatas é o de apressar as conversas para impedir que os bens suíços não sejam prejudicados.

Os direitos aduaneiros do Mercosul sobre as exportações suíças são elevados. Em média, um produto suíço paga uma tarifa de 7% para entrar nos mercados sul-americanos. Mas, em alguns produtos, essa taxa pode chegar a 35%.

No governo suíço, a estimativa é de que um eventual acordo comercial com o Mercosul gere um ganho potencial de mais de 200 milhões de francos suíços por ano para a economia suíça.
Mas caso o EFTA não consiga concluir um acordo de comércio livre com o Mercosul, os exportadores da UE terão uma vantagem em termos de custos que poderá atingir 35%. Hoje, os países do Mercosul importam mercadorias da Suíça no valor de mais de US$ 3 bilhões.

Sobre o autor

Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.

Sobre o blog

Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)