Ditaduras árabes querem Brasil em aliança ultraconservadora
GENEBRA – Regimes autoritários do mundo árabe querem contar com o Brasil para ser um dos aliados numa ofensiva ultraconservadora nos bastidores da ONU (Organização das Nações Unidas).
Os representantes dos governos árabes acenaram para a possibilidade de abrir um diálogo para incluir o Itamaraty em iniciativas de defesa da família, um tema que divide a comunidade internacional e é alvo de uma forte polêmica.
Os árabes tomaram a decisão de buscar uma aproximação ao Brasil depois que, na semana passada, o governo mudou radicalmente sua posição sobre direitos humanos e abriu um mal-estar com o bloco ocidental diante de suas posições sobre as mulheres, os direitos reprodutivos e os sexuais.
Em negociações no Conselho de Direitos Humanos da ONU, o Brasil vetou termos como "gênero" em vários projetos de resolução e foi alertado de que sua posição representaria um retrocesso de 25 anos no quadro internacional. Para o Brasil, não existiria "igualdade de gênero", mas apenas "igualdade entre homens e mulheres", dando uma conotação biológica aos termos. Especialistas interpretaram o posicionamento do governo como um esforço para minar orientações sexuais que não se encaixem nessa visão biológica.
A nova atitude do Itamaraty foi apoiada apenas por governos autoritários do mundo islâmico, além da Rússia. Os árabes, agora, querem ir além e incluir o Brasil num processo de médio e longo prazo para ganhar espaço com tal visão da família e de gênero dentro da máquina da ONU. Com isso, esperam enfraquecer pautas progressistas em diferentes fóruns internacionais.
A posição brasileira é radicalmente diferente ao posicionamento do Itamaraty no início do século 21, quando diplomatas em Brasília inovaram ao apresentar um projeto de resolução para indicar que ninguém deveria ser discriminado com base em sua orientação sexual.
Naquele momento, os países árabes se recusaram a aceitar o debate. O governo da Argélia, naquela ocasião, chegou a dizer que "a desorientação sexual" não era um assunto a ser levado para a ONU.
Agora, uma das ideias considerada inicialmente pelos muçulmano seria de ter o Brasil no núcleo duro de um grupo que tentará apresentar uma declaração conjunta para "defender a família". Na avaliação de governos ocidentais, essa posição é um ataque à diversidade das família e poderia minar direitos de homossexuais.
Ao blog, diplomatas árabes consideraram que uma eventual adesão do Brasil poderia acabar "arrastando" outros governos para uma posição similar.
Família no singular
Nos últimos anos, uma apresentação de uma resolução pelo Egito neste mesmo sentido já foi alvo de polêmica. Grupos LGBT acusaram a iniciativa de ser uma maneira disfarçada dos grupos ultraconservadores de minar qualquer criação de direito internacional que possa reconhecer gays.
O centro da polêmica está no fato de a resolução tratar apenas de "família", no singular. Europeus e outros países temem que, da forma que é apresentado, o texto não reconheça a existência de uma diversidade e que, assim, poderia ser usado como um precedente para barrar direitos de homossexuais em textos futuros.
A lista de países que apoiaram o texto é um espelho de regimes repressores contra gays, como Arábia Saudita, Qatar, Uganda e Rússia.
No passado, houve uma tentativa dos ocidentais de apresentar uma emenda. Nela, o texto ganharia uma frase extra, apontando para a "existência de várias formas de família". Mas, em uma votação, a emenda foi rejeitada.
Em resposta à derrota dos países ocidentais, os sauditas retiraram uma contraemenda em que declaravam que o casamento seria um ato apenas entre um homem e uma mulher.
Em 2014, quando o texto foi primeiro apresentado à votação e aprovado, os protestos por parte de governos europeus foram duros.
Ao ver que a emenda que reconhecia a existência de diferentes formas de família foi vetada, o governo britânico abandonou a diplomacia e lançou um ataque contra os demais governos. "Não sei como aqueles que votaram podem olhar uma criança no olho e dizer que, por elas não fazerem parte de um modelo imposto de família, eles não viriam de uma família de verdade", disse.
Naquele momento, o governo de Barack Obama, nos EUA, lamentou a aprovação da resolução.
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