Em resposta dura, governo Bolsonaro critica OIT
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Sede da ONU, em Genebra, será local das comemorações dos 100 anos da OIT. Foto: Jamil Chade
GENEBRA – Numa comunicação dura, o governo brasileira ataca a possibilidade da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de examinar as reformas no país e garante que sua compatibilidade com as regras internacionais. A entidade marca seus cem anos a partir de segunda-feira, em um evento que reunirá dezenas de chefes-de-estado. Mas o Brasil corre o risco de entrar numa espécie de "lista negra" de países que violam as convenções internacionais do trabalho.
No centro do debate sobre o Brasil está a Convenção 98 da OIT e a reforma trabalhista aprovada ainda pelo governo de Michel Temer.
Por enquanto, 40 países foram incluídos numa lista preliminar que, na próxima semana, será reduzida para 25 países que poderiam ser alvos de uma condenação. Na mesma lista estão países como Venezuela, Nicaragua, Uruguai e Argentina.
Já no ano passado, o Brasil foi incluído no exame. O governo, porém, fez questão de endurecer sua posição na entidade e não deu garantias de que iria aceitar nem mesmo a conclusão dos peritos da OIT.
Em 2018, a OIT acabou não condenando o Brasil. Mas pediu que o governo fizesse uma análise do impacto da reforma e que Brasília explicasse como foram as consultas com sindicatos antes da adoção da reforma. Os sindicatos insistem que foram ignorados, enquanto o governo garante que todos foram ouvidos.
Depois de um acalorado debate, a entidade não disse que houve uma violação e nem pediu a revisão das leis aprovadas, uma esperança dos sindicatos. Mas, ainda assim, manteve o Brasil na lista da OIT. Em 2019, ele voltou a ser examinado.
Uma decisão se o Brasil vai ser incluído na lista negra será tomada na próxima terça-feira, quando chefes-de-estado de todo o mundo estarão em Genebra para marcar o centenário da OIT. Jair Bolsonaro, apesar de ter sido convidado, não viajará ao evento.
Críticas e Soberania
Numa carta, o governo respondeu à iniciativa da OIT e indicou que foi com "perplexidade" que ouviu a notícia de que havia sido incluído na lista de países que poderão ser examinados. No comunicado, o Brasil sugeriu "vários problemas que substanciam sua insatisfação com a atitude da OIT".
Em sua defesa, o governo garante que "não violou qualquer" convenção da OIT e que sua legislação é "moderna". Brasília também alega que, depois de ter sido revista por diversos orgãos e comitês, a reforma trabalhista "está em linha com o sistema legal e não viola nem as leis domésticos e nem internacionais".
Mas foi a forma pela qual se defendeu que foi recebida com surpresa em Genebra. "É, acima de tudo, um ato democrático e soberano, cujo objetivo é o de permitir negociações coletivas, livres e voluntárias com certeza legal", explicou o governo na carta.
Em outro trecho do comunicado, o governo também avisou que não aceitaria que assuntos domésticos brasileiros sejam levados em consideração pela OIT ao avaliar as leis trabalhistas, numa alusão à suposta interferência da entidade em temas políticos nacionais.
"Deve ser sublinhado que assuntos internos do Brasil, sem relação qualquer com assuntos trabalhistas, não podem servir de base para pedir ao país apresentar explicações sobre uma lei que foi amplamente discutida no Congresso e que tem sido gradualmente implementada no contexto da relação legal entre trabalhadores e empregadores", disse.
"Neste sentido, a inclusão do Brasil na lista preliminar, pelo segundo ano consecutivo, é injustificado", alertou.
Em Genebra, o tom da carta foi recebido com cautela, já que o orgão que trata do assunto é meramente técnico e que foi justamente um ato "soberano" do Brasil que o levou a ratificar convenções internacionais.
Números
O comunicado ainda traz números apresentados pelo governo para provar que a reforma trabalhista não gerou uma queda no número de acordos coletivos entre trabalhadores e empregadores. De acordo com Brasilia, cerca de 13,4 mil acordos coletivos foram assinados no país em 2017, contra 11,2 mil em 2018 e 12 mil em 2019.
Para o governo, isso foi uma das provas de que não houve uma "queda alarmante dos acordos, como afirmado por aqueles que não conheciam os dados". Na prática, segundo o governo, não houve um obstáculo para a continuação da barganha coletiva no Brasil e, portanto, não se poderia falar em violações das convenções internacionais.
Mas, em Genebra, a interpretação é de que a situação em 2019 pode levar a um aprofundamento da tensão entre a OIT e o governo brasileiro. No ano passado, Brasilia comemorou a decisão de que uma condenação foi evitada. "Estamos tranquilos", afirmou na época o ministro do Trabalho, Helton Yomura. Numa reunião tensa, Yomura deixou claro ao diretor-geral da OIT, Guy Ryder, que o governo brasileiro "não aceitaria" se o assunto ganhasse uma nova proporção, com uma eventual condenação.
Internamente no Ministério do Trabalho, a cúpula da pasta chegou a cogitar até mesmo uma saída do Brasil da OIT caso uma comissão de inquérito fosse aberta, numa decisão de protesto contra a politização da entidade.
Para ele, a inclusão do Brasil na lista mostrava que "o sistema falhou" e que uma "reforma é urgente". "Lamentamos essa politização", disse o então ministro. "Não podemos aceitar. Rejeitamos ataques às suas instituições", afirmou.
Agora, caso haja o exame conduza o Brasil a uma condenação, a tensão pode ficar ainda mais explícita.
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