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Jamil Chade

Cúpula venezuelana teria mais de 700 contas secretas na Suíça

Jamil Chade

24/04/2019 04h00

 

GENEBRA – A cúpula venezuelana teria mais de 700 contas secretas na Suíça, reabrindo uma polêmica no país europeu por conta do papel de seus bancos na administração de dinheiro sujo de diversas origens suspeitas.

Em meados de 2018, a Justiça norte-americana anunciou que investigações em colaboração com a Suíça resultaram na prisão de um ex-banqueiro suíço, Matthias Krull. Ele fechou um acordo de delação premiada e admitiu a existência do esquema que lavou mais de US$ 1,2 bilhão, principalmente ao promover desvios da PDVSA e de pessoas próximas ao governo venezuelano. Nos últimos meses, o país tem registrado um colapso sem precedentes na sua economia.

De acordo com o Departamento de Justiça, Krull "admitiu culpa em uma denúncia de conspiração para cometer lavagem de dinheiro".

Pressionadas, porém, as autoridades suíças passaram a avaliar a dimensão da delação. A suspeita é que Krull fosse o gerente de cerca de 700 contas na Suíça em nome de mais de 70 venezuelanos. Agências de regulação do sistema financeiro estão avaliando o caso em Berna, enquanto bancos afirmam que estão cooperando no processo para identificar as transações.

"Como parte de sua delação, Krull admitiu que, em sua posição num banco suíço, ele atraía clientes privados, especialmente clientes da Venezuela", indicou o Departamento de Justiça dos EUA.

Mas o documento oficial da Justiça dos EUA alerta que, entre as dezenas de clientes do ex-banqueiro, estavam também três venezuelanos especialmente importantes. Pessoas próximas ao caso confirmaram que eles são os três enteados de Nicolás Maduro. Krull, como parte do acordo com a Justiça americana, aceitou colaborar com as investigações relativas às pessoas próximas a Maduro.

Uma apuração inicial constatou que esses familiares teriam desviado uma fortuna de mais de US$ 180 milhões. Mas os detalhes do destino dos recursos não foram revelados por enquanto.

De uma forma geral, o que se sabe é que um dos caminhos para justificar as transações era o esquema de câmbio entre o bolívar e o dólar. Com 44 anos, Krull trabalhava para o banco suíço Julius Baer. De nacionalidade alemã e residente do Panamá, ele havia deixado a instituição em julho.

Ainda no ano passado, o banco confirmou que estava cooperando com as autoridades e que estava conduzindo investigações internas.

Lavagem – Krull, porém, também confessou que usou propriedades na Flórida, falsas declarações de investimentos e esquemas com administradores de contas para permitir que o dinheiro desviado fosse lavado. Como resultado, 17 imóveis foram congelados pela Justiça americana.

Um dos locais de luxo está em nome do ex-assessor legal do Ministério de Petróleo e Mineração da Venezuela, Carmelo Urdaneta. Com um serviço de concierge 24 horas por dia pronto para atender os desejos de seus clientes até mesmo para alugar um jato de última hora, o prédio do chavista conta piscinas privativas aquecidas e até cofres especialmente desenhados para vinhos raros, além de uma vista única sobre o Atlântico.

Uma das grandes atrações do local é ainda o sistema de elevadores que permite que o morador possa levar o seu carro para o andar de seu apartamento.

Apenas esse apartamento teria um valor de US$ 5,3 milhões. No total, os 17 imóveis poderiam chegar a valer US$ 35 milhões.

Outros quatro imóveis no condomínio fechado de Cocoplum, em Coral Gables, estão em nome de Mario Enrique Bonilla Vallera, um empresário venezuelano e que é suspeito de ser a pessoa que movimentaria recursos em benefício dos enteados de Maduro.

Na região de Wellington, conhecido por seus haras, dois terrenos de um total de 9.000 m² perto de Palm Beach também foram congelados. Ainda que os nomes dos donos não tenham sido divulgados, só a residência num dos terrenos teria mais de 600 m², com um valor total de mais de US$ 3 milhões.

Seis apartamentos foram ainda retidos pela Justiça num prédio da rua 27 de Miami Beach, avaliados em US$ 3,1 milhões. A lista ainda inclui uma casa e 400 metros quadrados na Hibiscus Lane, também em Miami, e avaliados em US$ 2,7 milhões.

Sobre o autor

Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.

Sobre o blog

Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)