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Jamil Chade

Com Damares na ONU, Brasil e latinos planejam boicote contra Maduro

Jamil Chade

24/02/2019 04h00

Proposta que está sendo avaliada prevê que diplomatas e ministros deixem a sala de reuniões nesta semana quando o chanceler venezuelano discursar em Genebra. Delegação brasileira será liderada por Damares Alves.

GENEBRA – O governo brasileiro e o Grupo de Lima estudam promover um boicote ao regime de Nicolás Maduro na ONU. O ato pode ocorrer nesta terça-feira (26), quando se iniciam os trabalhos do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas e em outras reuniões. A meta é a de demonstrar que não há um reconhecimento internacional sobre a legitimidade dos representantes do governo bolivariano.

O chanceler da Venezuela, Jorge Arreaza, promete um discurso duro no palco das Nações Unidas contra o que Caracas chama de "intervenção". No ano passado, também em Genebra, o mesmo ministro havia declarado que não existia crise humanitária na Venezuela e nem um êxodo. Segundo a ONU, 3,2 milhões de venezuelanos já deixaram o país.

Na última quinta-feira, o Grupo de Lima se reuniu para debater a presença do venezuelano na ONU e as ações que poderão ser tomadas. Uma das propostas é que todos os países promovam um "walk out", abandonando a sala de reunião enquanto Arreaza discursa, justamente para demonstrar que não reconhecem aquele governo como o poder legítimo na Venezuela.

Desde janeiro, Brasil, Colômbia, Equador e outros países passaram a considerar Juan Guaidó como o legítimo presidente da Venezuela.

Outro protesto similar pode ocorrer quando o mesmo chanceler falar diante da Conferência do Desarmamento da ONU, também na terça-feira. Fontes diplomáticas de países vizinhos ao Brasil confirmaram ao blog que se avalia um "ato de protesto" durante o discurso do regime de Maduro.

A delegação brasileira será liderada pela ministra de Direitos Humanos, Damares Alves, que fará sua estreia internacional no púlpito da ONU na segunda-feira, dia 25.

Para que ela não tenha de sair andando diante da presença do venezuelano, uma das opções é de que ela "coincidentemente" não esteja na sala no momento do discurso de Arreaza e que reuniões sejam organizadas neste mesmo momento. Mas, ainda assim, os diplomatas brasileiros acompanhariam o restante da reunião e, no mesmo do discurso do venezuelano, se retirariam.

Entre este domingo e segunda-feira, as capitais estarão em consultas para avaliar o que fazer diante do discurso e confirmar se o boicote será efetuado. A opinião do Brasil é que tal gesto apenas tem sentido se ele for promovido por todos do grupo.

No caso do Uruguai, porém, a diplomacia de Montevidéu continua insistindo sobre a necessidade de se manter um diálogo para encontrar uma solução, uma postura parecida ao que a ONU, nos bastidores, tenta adotar.

Enquanto se estuda como reagir diante de Arreaza, a diplomacia brasileira na ONU já começa a receber a visita de pessoas consideradas como embaixadores do governo de Juan Guaidó. O encontro ocorreu na última sexta-feira, em Genebra.

O gesto do boicote é raro nos fóruns internacionais. Na ONU, governos ocidentais abandonaram a sala de reuniões em 2011 quando o então presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, tomou a palavra para discursar.

Sobre o autor

Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.

Sobre o blog

Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)