Relatores da ONU pedem a Bolsonaro para abandonar extinção dos conselhos
Jamil Chade
13/06/2019 19h13
Sede da ONU, em Genebra. Foto: Jamil Chade
GENEBRA – Relatores, comitês e peritos da ONU atacam a decisão do governo Jair Bolsonaro de extinguir com conselhos e órgãos colegiadas da administração pública federal e pedem que o Palácio do Planalto abandone a ideia.
Numa carta enviada ao Palácio do Planalto, os representantes alertaram que o decreto de 11 de abril minaria a participação da sociedade civil em assuntos sociais, além de ser negativa para a "democracia brasileira, estado de direito, a inclusão social e o desenvolvimento econômico".
Os especialistas ainda estimam que o decreto afeta a transparência, reduz a independência e autonomia da sociedade civil e "ameaça a promoção e proteção dos direitos humanos":
Nesta quinta-feira, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votaram contra o decreto do governo Bolsonaro que desmonta as estruturas a partir do dia 28 de junho. O presidente estuda agora apresentar um projeto de lei com modificações no texto. Mas essa foi a primeira medida do governo a enfrentar uma derrota no plenário do Supremo.
A pressão também vem da ONU, além da Comissão Inter-Americana de Direitos Humanos. As entidades estimam que órgãos que lidam com idosos, grupos LGBT, combate à discriminação, erradicação de trabalho infantil e vários outros seriam duramente afetados. Numa primeira avaliação, 55 órgãos colegiadas seriam extintos.
"Estamos seriamente preocupados", disseram os relatores, apontando que o decreto "mina o espaço cívico" e a "participação da sociedade civil dentro do governo federal".
De acordo com a ONU, ao longo dos anos, a participação da sociedade civil permitiu que diferentes setores da população estivessem "mais diretamente envolvidos com a administração pública, particularmente no desenho, implementação e controle sobre políticas públicas".
"A eliminação dessas instâncias poderia reforçar a exclusão desses grupos", alertaram. Para os relatores, o decreto também afetaria a capacidade de diálogo desses setores com as autoridades.
A carta ainda aponta que a decisão poderia "desmantelar o resultado de 30 anos de participação da sociedade civil no processo decisório e na formulação de políticas".
No documento, os relatores pedem que o governo abandone a ideia e que garanta a participação da sociedade civil, conforme os compromissos assumidos pelo estado brasileiro.
O grupo conclui com um alerta ao governo Bolsonaro ao apontar que uma "sociedade democrática" tem como pilares a liberdade de associação, o direito à participação em assuntos públicos, o direito ao voto e o direito de acesso a serviços públicos.
Sobre o autor
Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.
Sobre o blog
Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)