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Procurador-geral suíço é acusado de manter encontros secretos com Lava Jato

Jamil Chade

23/05/2019 08h41

 

GENEBRA – Vivendo um terremoto por conta de seus encontros não registrados com o presidente da Fifa, o procurador-geral da Suíça, Michael Lauber, é acusado também de ter mantido reuniões secretas de seu escritório e procuradores com autoridades  brasileiras envolvidas na Operação Lava Jato. Os encontros não são proibidos. Mas eles precisam ser formalizados e documentados.

A denúncia parte do advogado suíço Rolf Schuler, representante da defesa de um dos envolvidos nas investigações. Em declarações ao jornal NZZ, ele revelou como autoridades brasileiras teriam realizado viagens para a Suíça para encontros não registrados com o escritório de Lauber. O mesmo teria ocorrido no Brasil.

O objetivo, segundo ele, seria realizar uma troca de informações para, então, iniciar inquéritos de lavagem de dinheiro. Desde 2014, Lauber tem sido fundamental para o avanço da Lava Jato, garantindo uma troca de dados. Sem essa cooperação, fontes na Justiça admitem que o combate à corrupção no Brasil não teria atingido o patamar registrado.

Ao longo dos últimos quatro anos, foram milhares de documentos transferidos por Lauber ao Brasil que permitiram que políticos, empresas e operadores fossem presos, indiciados e mesmo condenados no País.

Hoje, a Suíça ainda tem mais de US$ 700 milhões congelados em nome de suspeitos da Lava Jato. Outros US$ 350 milhões já foram devolvidos ao Brasil.

Procurado pelo blog, a Procuradoria-Geral em Berna não respondeu às acusações do advogado suíço.

Na semana passada, Lauber passou a ser investigado e um inquérito disciplinar foi aberto. Ele é suspeito de ter mantido reuniões informais e não declaradas com o presidente da Fifa, Gianni Infantino. O problema: Lauber também investiga a Fifa desde 2015 e seus cartolas pelo escândalo de corrupção que levou à prisão mais de uma dezena de dirigentes e operadores do futebol.

O que o inquérito quer saber, agora, é se Lauber violou seus deveres de função ao manter reuniões não declaradas com o presidente da entidade que ele mesmo investigava.

O encontro com Infantino, outro suíço, não seria um ato ilegal. Mas Lauber não os documentou e nem os informou aos demais procuradores.

No total, a suspeita é de que Lauber tenha mantido três encontros com o presidente da Fifa. Ao ter sua agenda revelada pela imprensa, Lauber declarou em novembro de 2018 que admitia que esteve com Infantino em duas ocasiões, ambas em 2016. Mas ele insistia que não se lembrava de um terceiro encontro, supostamente realizado em 2017.

 

Atrasos

Fontes em Berna e Genebra que trabalham com casos de corrupção temem que, diante da crise no MP suíço, casos de grande proporção como o da Lava Jato sejam retardados e que processos sejam congelados.

Existem ainda cerca de 60 processos criminais abertos contra suspeitos de corrupção envolvendo Odebrecht, Petrobras e outras empresas e políticos brasileiros.

Há uma semana, numa coletiva de imprensa, Lauber admitiu que o processo contra ele pode, de fato, retardar os trabalhos sobre a Lava Jato. "Tudo tem impacto, tudo", disse.

Para ele, existe a risco de que a situação em seu escritório seja visto como uma "crise institucional" e que, portanto, seja usada por advogados. Sua avaliação é de que todos os demais parceiros seriam afetados, inclusive Brasil e Malásia.

"Temos que decidir alguns casos se vamos indiciar (os suspeitos) ou encerra-los", disse.
Lauber, porém, insiste que não abre mão de sua candidatura a mais um mandato e garante que "sempre diz a verdade". "Cabe ao Parlamento dizer", insistiu. "Se eu não me defender, não vai funcionar. Eu sei o que eu fiz e eu sei o que eu disse", declarou.

Visivelmente irritado, ele alertou que o processo é um ataque contra a independência de seu escritório. De acordo com ele, sua função é a de defender não apenas seu nome. Mas o próprio trabalho do Ministério Público da Suíça e proteger os grandes casos investigados pelos procuradores. "Minha tarefa é ficar e dar respostas", insistiu.

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Sobre o autor

Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.

Sobre o blog

Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)


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