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Jamil Chade

Brasil se cala diante de denúncias de crime de guerra contra Israel

Jamil Chade

18/03/2019 13h14

Comissão de Inquérito criada pela ONU concluiu que a violência do governo israelense em Gaza pode constituir crimes de guerra ou crimes contra a humanidade. Às vésperas de viagem de Bolsonaro para Tel Aviv, Itamaraty instruiu missão do Brasil na ONU a não se pronunciar durante debate nesta segunda-feira.

 

GENEBRA – Às vésperas de sua visita para Israel, o governo de Jair Bolsonaro silencia na ONU diante das acusações contra as operações militares por parte de Benjamin Netanyahu, em Gaza.

Nesta segunda-feira, a Comissão de Inquérito formada para apurar os confrontos de 2018 entre palestinos e israelenses apresentou seu informe diante da ONU e concluiu que a violência do governo de Tel Aviv pode constituir um crime de guerra.

De acordo com as investigações da ONU, soldados israelenses atiraram sobre manifestantes desarmados, matando pelo menos 189 palestinos em 2018. Mais de 6 mil palestinos ainda ficaram feridos em confrontos com forças de Israel, entre março e dezembro de 2018.

"As forças de segurança de Israel cometeram violações de direitos humanos e de direito humanitário", apontou o informe. "Algumas das violações podem constituir crimes de guerra ou crimes contra a humanidade", alertaram os autores do documento de mais de 250 páginas.

Durante o debate desta segunda-feira sobre a situação dos territórios ocupados da Palestina, tomaram a palavra os governos do Chile, Uruguai, Bolívia, Venezuela, Cuba e Equador, além de diversos outros europeus, africanos e do Oriente Médio. Também se pronunciaram russos, chineses e sul-africanos.

Tradicional presente nos debates sobre o Oriente Médio, o Brasil se manteve em silêncio. O blog apurou em Brasília que a atitude da diplomacia do Itamaraty não foi por acaso. Instruções foram enviadas pela chancelaria à missão do Brasil na ONU, ordenando um silêncio diante das acusações. A missão é chefiada por Maria Nazareth Farani Azevedo, embaixadora que protagonizou um bate boca na semana passada com Jean Wyllys.

No dia 30 de março, Bolsonaro viajará para Israel e seu governo tem indicado que quer uma aproximação com Netanyahu. O presidente brasileiro chegou a prometer que mudaria a embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém, num sinal do reconhecimento da cidade santa como a capital de Israel.

Mas Bolsonaro irá para o Oriente Médio sem uma definição sobre essa mudança, em especial diante da pressão do setor exportador brasileiro que vê o risco de perder espaço no lucrativo mercado de carnes da região árabe.

Snipers – Na ONU, os investigadores concluíram que não existia justificativa para que as forças israelenses atirassem sobre pessoas que "não representavam uma ameaça iminente".

O inquérito ainda revelou que Israel destacou snipers para a região da fronteira de Gaza e que foram usadas munições de alta velocidade, com alta sofisticação. "Eles não atiraram uma ou duas vezes. Mas sim mais de 6 mil vezes", destacou Sara Hossain, uma das investigadoras. "Os snipers mataram 32 crianças, três paramédicos e dois jornalistas", indicou.

Israel, porém, justificou que os protestos nas proximidades da grade que separa Gaza eram, na realidade, uma iniciativa terrorista camuflada de protesto civil. A comissão de inquérito, porém, deixou claro que não concorda com tal avaliação.

Sobre o autor

Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.

Sobre o blog

Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)