Postura de Bolsonaro na Amazônia irá gerar "reação anti-Brasil", diz Sachs
Jeffrey Sachs não descarta imposição de barreiras comerciais em caso de desmatamento e alerta que o tom agressivo do presidente é um "enorme erro" e um "perigo" para o Brasil.
GENEBRA – Ao adotar um tom agressivo na relação com outros governos e em seu discurso na ONU, o presidente Jair Bolsonaro está cometendo um "enorme erro" e se transformando em um "perigo" para o Brasil.
A avaliação é de Jeffrey Sachs, professor da Universidade Columbia e considerado pela revista Time como uma das pessoas mais influentes do mundo. Num evento nesta terça-feira em Genebra na Organização Mundial do Comércio (OMC), o americano insistiu sobre a necessidade de que haja "coerência" entre tratados comerciais e ambientais.
Na prática, isso poderia ser traduzido na autorização para que países possam impôr barreiras comerciais contra o Brasil ou outras economias caso elas não cumpram suas responsabilidades ambientais, ou que tentem exportar produtos de regiões que foram devastadas para que tais bens sejam cultivados.
Em entrevista ao UOL, o americano fez questão de avaliar a participação de Bolsonaro na abertura da Assembleia Geral da ONU e a política externa do atual governo. Em sua avaliação, o caminho adotado pelo governo, assim como no caso de Donald Trump, é "extremista, simplista e nacionalista".
"O discurso na ONU de que é assunto da Amazônia nosso – fazemos o que queremos – não vai funcionar", disse. "Isso é um enorme erro e um enorme perigo para o Brasil ter tal atitude", alertou o americano, apontando para as "coincidências" entre os termos usados por Bolsonaro e por Trump na ONU.
Sachs criticou a "agressividade" de Bolsonaro ao dar uma resposta ao mundo. "O mundo está preocupado. Não se pode simplesmente ignorar isso. Os brasileiros também estão preocupados", disse.
O americano acredita que empresas estrangeiras serão cada vez mais forçadas a dar uma resposta ao debate ambiental e isso pode ser prejudicial ao Brasil. "O que vai ocorrer é que companhias estarão sob pressão para não comprar produtos agrícolas do Brasil se o País não administrar de forma adequada a proteção dessa vasta biodiversidade", avaliou.
"Essa pressão vai ocorrer. Em todo o mundo, as pessoas estão profundamente preocupadas com o meio ambiente e o desmatamento, mineração ilegal. As pessoas querem ver o governo do Brasil e outros governo da região Amazônica atuando de forma responsável", alertou.
"Se eles não agirem de forma responsável, a agro-indústria vai sofrer uma dura resposta dos consumidores e isso já está ocorrendo", afirmou. "Haverá uma reação anti-Brasil se a destruição continuar", disse.
Segundo ele, já existe a percepção entre os produtores agrícolas brasileiros de que o governo Bolsonaro terá de cuidar da Amazônia. Para o acadêmico, Bolsonaro não atua "em nome" do agronegócio. "Muito pelo contrário. Ele está minando seus interesses", disse.
Sachs alerta que não existe apenas um risco para a imagem do Brasil. Segundo ele, a própria produção pode ser afetada. "Se houver queimada, é toda a produção agrícola que irá desabar. De onde virá a chuva? Como irá cultivar o café no Sul se a Amazônia for destruída? Conhecemos o ciclo e toda a América do Sul depende da Amazônia", disse.
Barreiras
Durante seu discurso diante de mais de mil pessoas, Sachs apontou para uma nova direção no debate sobre comércio e meio ambiente.
"Não podemos importar (produtos) se eles vem de regiões que acabam de ser devastadas da floresta tropical", disse. "Pode colocar barreiras", afirmou. "Essa coerência vai ter de se construída. Vai ser difícil ela ser criada", admitiu o americano, chamando os governos que não cumprem suas obrigações de "estados párias".
Citando a ausência do Brasil nos debate sobre o clima em Nova Iorque, em setembro, Sachs insistiu que perguntas "fundamentais" precisam ser colocadas: "como vamos comercializar com o Brasil se não participa do esforço climático?". "São questões delicadas. Mas temos de lidar com tais temas se queremos ir adiante", defendeu o americano que foi conselheiro no FMI, no Banco Mundial, na OCDE, na Organização Mundial de Saúde e no Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas.
Sachs definiu a questão ambiental como "existencial" e classificou os incêndios na floresta como "uma dramática limpeza de terra".
As declarações do americano ocorrem um dia depois que, no Reino Unido, o Parlamento iniciou um exame de uma petição que solicitava que sanções fossem impostas contra o Brasil por conta dos incêndios na Amazônia.
Na UE, diferentes governos tem alertado sobre a vinculação da ratificação do tratado Mercosul-Europa com aspectos ambientais. O próprio acordo, assinado em julho, estabelece que os europeus terão o direito de adotar medidas se houver um desmatamento causado pelas exportações de bens para a UE. Mas, por enquanto, poucos sabem dizer como esse mecanismo funcionaria.
O americano também atacou de forma dura seu próprio governo, liderado por Donald Trump. Em sua avaliação, a Casa Branca está levando o cenário internacional à beira de um colapso do sistema multilateral.
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