Chanceler terá de explicar posição ultraconservadora do Brasil na ONU
GENEBRA – A Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados solicitou o comparecimento de Ernesto Araújo, ministro das Relações Exteriores, para que explique o veto do Brasil em diferentes resoluções da ONU de expressões como gênero, feminismo e saúde reprodutiva da mulher.
O requerimento foi aprovado e o chanceler deve comparecer no dia 7 de agosto para dar suas explicações.
O blog revelou na semana passada como, em reuniões para negociar resoluções da ONU, a diplomacia brasileira causou enorme surpresa ao se alinhar com países como a Arábia Saudita e outras ditaduras em questões relacionadas com a família e a saúde da mulher.
Termos como "igualdade de gênero" foram vetadas pelo governo, que pedia que os trechos fossem substituídos por "igualdade entre homem e mulher". Questões que pudessem dar brechas a "direito sexual" também foram vetadas, além de mais de uma dezena de ações por parte do governo para modificar termos já acordados pela comunidade internacional nos últimos anos.
A atitude do Brasil deixou delegações ocidentais indignadas. O México, por exemplo, lembrou que existem mais de 200 resoluções, textos e documentos internacionais com as referências que, hoje, o Itamaraty quer vetar. Outras delegações ainda apontaram como aceitar a posição do governo Bolsonaro representaria um retrocesso de 25 anos no debate sobre a saúde da mulher.
Numa recente reunião, enquanto o governo brasileiro se aliava a algumas das delegações mais conservadoras do mundo, a diplomacia da Noruega fazia um apelo: "vamos nos lembrar das meninas de dez anos que são obrigadas a se casar com homens de 60 anos." "É para elas que estamos aqui", comentou, num tom duro.
O requerimento para que o chanceler dê suas explicações foi de autoria das deputadas Fernanda Melchionna (Psol-RS) e Talíria Petrone (Psol-RJ). Para elas, o posicionamento "retrata o alinhamento da política externa a valores conservadores e obscurantistas".
"O que se observa é que o Ministro Ernesto Araújo está, à revelia deste Poder Legislativo e mesmo do Judiciário, conduzindo o Brasil a um alinhamento ao conjunto de países mais retrógrados do mundo, no que diz respeito sobretudo aos direitos das mulheres e da população LGBTI, e ainda colocando em risco a liderança e credibilidade internacional de nosso país. Tudo isso sob o pretexto de combater um suposto "marxismo cultural" ou "globalismo"", aponta o texto do requerimento.
Para Fernanda, a postura do governo mostra que eles acreditam que "a luta contra a discriminação e a violência à população LGBTI+ e às mulheres é uma tentativa de manipular a sociedade para que se ache normal algo que é puramente ideológico por parte da esquerda".
"Como se a visão desses moralistas da extrema-direita não fosse ideológica", criticou.
"Além disso, as manifestações dos diplomatas brasileiros na ONU, solicitando a retirada da expressão "gênero" e a frase como "vulnerabilidade à violência sexual e com base em gênero" de resoluções é uma forma de negar o machismo estrutural como uma das razões da violência contra nossas mulheres e o acúmulo de teorias da antropologia, filosofia e da sociologia que define gênero, sim, como uma construção social", declarou.
"Esse comportamento do Brasil tem deixado a maior parte das representações, de países que mantém relações diplomáticas com nosso país, estupefatos." concluiu Fernanda.
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