Nas urnas, suíços vão decidir futuro das armas
GENEBRA – Os suíços vão às urnas no próximo fim de semana para decidir se aceitam a nova Lei de Armas proposta pelo governo e que irá dificultar o acesso a certos rifles e estabelecer um maior controle sobre as vendas.
De acordo com as pesquisas de opinião, mais de 60% dos eleitores indicam que estão dispostos a aceitar regras mais rígidas num dos países com o maior índice de armas em proporção ao tamanho de sua população.
O plebiscito ocorre por conta de uma tentativa por parte de partidos de direita e de grupos pró-armas de derrubar, com o voto popular, uma decisão já aprovada pelo Legislativo.
A medida é uma necessidade de adaptar a lei nacional às normas da União Europeia. Apesar de a Suíça não fazer parte do bloco, ela é parte do Acordo de Schengen, tratado que estipula uma livre circulação de pessoas e define fronteiras comuns entre os países do continente.
A partir dos ataques contra o semanário Charlie Hebdo em Paris, em 2015, a UE passou a endurecer suas regras para a venda de certas armas e, por fazer parte do mesmo acordo, os suíços também terão de adotar a nova legislação. Caso contrário, estarão potencialmente excluídos de Schengen.
O governo suíço havia sugerido seguir a linha europeia, o incluiria tornar a compra de armas mais difícil, aumentar a cooperação entre governos e ainda criar um mecanismo para monitorar uma arma. No centro do debate estão as armas semiautomáticas, usadas pelos terroristas em Paris. De acordo com os autores da proposta, se a nova lei entrar em vigor, será mais difícil que tais armas entrem no mercado clandestino e que abasteça grupos criminosos ou terroristas.
No ano passado, o Parlamento suíço aprovou o texto. Pela nova lei, donos de armas semiautomáticas terão três anos para registrá-las. Quem quiser comprar uma dessas armas terá de preencher formulários e explicar o motivo pelo qual necessita uma arma com tal poder de fogo.
Para quem pratica o tiro, provas a cada cinco anos precisam ser apresentadas para confirmar que o dono da arma de fato frequenta um clube e que pratica o tiro com certa regularidade. Também haverá regras claras para colecionadores e até mesmo para museus.
A legislação também afeta os produtores e importadores, que serão obrigados a comunicar ao governo cada vez que uma arma, peças ou munições são vendidas. A notificação precisa ocorrer num espaço de 20 dias.
Os suíços conseguiram arrancar da UE algumas exceções. Bruxelas, por exemplo, queria que fosse declarado que ficaria proibida a qualquer cidadão a posse de uma arma semiautomática. Pelo entendimento, licenças específicas vão ser criadas e reguladas pelas autoridades.
A UE também cedeu no que se refere aos rifles que os soldados recebem quando vão ao Exército. Pelas tradições locais, esses cidadão podem ficar com suas armas após o serviço militar ser concluído. A ideia é que eles possam continuar praticando o tiro e, em uma eventual invasão externa, estar prontos para defender o país.
O resultado é que, hoje, num país com 8,5 milhões de pessoas, cerca de 2,5 milhões de armas estariam circulando, uma das maiores taxas do mundo. Apenas três países teriam um índice superior: EUA, com 101 armas para cada cem habitantes, Alemanha, com 32 para cada cem pessoas, e a Áustria, com 30 para cada cem cidadãos.
Contra
Mas a lei aprovada pelo Parlamento passou a ser contestada, principalmente pelo partido de direita, o SVP. Dois argumentos foram apresentados: a lei estava desarmando a população e minando a independência da Suíça, que tradicionalmente conta com um exército de milícias.
O partido ainda conseguiu um poderoso aliado: os clubes de tiro do país, que, aliados aos grupos pró-armas, formaram uma frente para tentar impedir que a nova legislação seja adotada.
Respeitando a democracia direta da Suíça, os grupos conseguiram reunir mais de 120 mil assinaturas em menos de três meses, obrigando o governo a convocar um plebiscito. Chegar a esse número não foi uma tarefa complicada para o partido de direita. Apenas os 2.900 clubes de tiro reúnem mais de 130 mil filiados na pequena Suíça.
Com a maioria de seus membros comprando armas semiautomáticas, os clubes passaram a considerar a lei como uma ameaça a um dos esportes mais tradicionais do país.
Mas o que está em jogo nas urnas vai muito além de um esporte. Para o partido de direita, a campanha é pela suposta liberdade do cidadão, simbolizada pela posse de uma arma.
A campanha também tenta insistir na questão da independência e neutralidade da Suíça. Para membros do partido SVP, a lei seria o início de uma transferência de soberania de Berna para Bruxelas. O controle de armas, segundo o grupo, é típico de "regimes ilegítimos", e não de uma democracia.
Mulheres
De ambos os lados do debate, porém, são imagens de mulheres que estão sendo usadas para convencer os eleitores. Pelo governo, a porta-voz do controle de armas é a ministra da Justiça, Karin Keller-Sutter.
Ela tem percorrido o país para fazer uma garantia: a tradição de armas de séculos não seria minada. Mas também tem alertado que um resultado negativo representaria uma ameaça para os acordos de livre circulação do país.
Do outro lado, a porta-voz do grupo pró-armas é a advogada Olivia de Weck. Pelas cidades suíças, é seu rosto jovem que substitui um setor que, em grande parte, é liderada por homens.
Faltando poucos dias para a votação e com parte do processo já realizado por correio, as pesquisas apontam que os suíços optarão pelo maior controle das armas.
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