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Jamil Chade

Grupos armados exploram trilhas usadas por imigrantes venezuelanos

Jamil Chade

05/04/2019 06h29

Militares venezuelanos impendem a circulação de pessoas e veículos na fronteira com Pacaraima, RR (Ricardo Moraes/Reuters)

Fechamento de fronteiras com o Brasil e Colômbia ameaça milhares de pessoas, que são obrigadas a cruzar rios e atravessar a floresta para fugir da Venezuela

 
GENEBRA – Milhares de venezuelanos continuam cruzando de forma ilegal a fronteira em direção ao Brasil e Colômbia, apesar do fechamento de todos os pontos oficiais de passagem. O alerta é da ONU que, nesta sexta-feira, indicou que os refugiados e migrantes estão chegando aos países vizinhos cruzando rios e atravessando a floresta, colocando suas vidas em risco.

No dia 23 de fevereiro, o governo de Nicolas Maduro anunciou o fechamento das fronteiras com o Brasil e Colômbia.

Mas o fluxo de pessoas continuou. A diferença: os imigrantes e refugiados tiveram de passar a usar caminhos alternativos e descobriram que, muitos deles, estavam sendo controlados por grupos armados e organizações criminosas, que passaram a lucrar com o êxodo.

"Muitos estão arriscando suas vidas, cruzando rios com fortes correntes e arriscando serem explorados e abusados por grupos armados que controlam caminhos irregulares", alertou Andrej Mahecic, porta-voz da ONU para Refugiados.

Hoje, a entidade estima que 3,4 milhões de venezuelanos vivem fora do país. Por dia, cerca de cinco mil pessoas continuam a deixar a Venezuela. "As pessoas que estão desesperadas vão encontrar uma forma para cruzar a fronteira", disse.

De acordo com Mahecic, aqueles que desembarcam do outro lado da fronteira estão relatando casos em que grupos armados e organizações criminosas estão explorando esses caminhos e existe inclusive o risco de que parte deles acabem sendo recrutados.

Outro risco é de que essas pessoas, já com sérias limitações financeiras, acabem sendo obrigadas a contrair dívidas importantes para poder pagar para que utilizem os caminhos irregulares.

Rios – O fechamento das fronteiras também tem colocado em risco os venezuelanos, que são obrigados a cruzar rios. Nos últimos dias, porém, as chuvas elevaram os níveis de alguns desses rios e inundaram os caminhos clandestinos por meio da floresta.

Um dos rios usados é o Tachira que, diante das chuvas, passou a ser um risco para aqueles que tentam cruzar.

Sem poder contar com as alternativas ilegais, muitos voltaram a tentar usar os caminhos tradicionais, fechados pelas autoridades. O resultado foi o acúmulo de 46 mil pessoas sobre a ponte Simon Bolivar, entre as cidades de San Antonio de Tachira e Cucuta, que optaram pelo caminho tradicional diante dos riscos nos rios e trilhas clandestinas.

A situação levou a ponte a registrar um caos, colocando uma vez mais em risco milhares de pessoas.

De acordo com a ONU, o risco é de que, com a temporada das chuvas ganhando força na região nas próximas semanas, os riscos para os venezuelanos serão cada vez maiores para cruzar as fronteiras.

Sobre o autor

Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.

Sobre o blog

Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)