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Jamil Chade

Criador da Web se lança em novo desafio: salvar sua criação

Jamil Chade

12/03/2019 14h19

 

Tim Berners-Lee, criador da Web, se lança em um novo desafio: salvar sua invenção. Foto: Rodrigo Paiva/UOL

 

Ao comemorar 30 anos da Internet, Tim Berners-Lee não esconde que está preocupado com desinformação e o discurso de ódio que ganharam uma nova dimensão com sua invenção

 

GENEBRA – O inventor da World Wide Web, Tim Berners-Lee, está preocupado: sua invenção precisa ser salva e uma nova etapa da rede precisa começar. Nesta terça-feira, a Web comemora 30 anos. Mas o que era para ser apenas uma festa se transformou em um momento de reflexão.

O sistema foi estabelecido em Genebra pelo Centro Europeu de Pesquisas Nucleares (Cern), justamente pelo jovem engenheiro que, em 1989, procurava uma forma de conectar computadores e criou o hypertext-transfer protocol, também conhecido por sua abreviação: o "http".

30 anos depois, o britânico sabe que sua criação mudou a história do mundo. Mas alerta: há um risco real diante de hacking patrocinado por estados, a difusão do discurso de ódio e a desinformação. Para ele, não restam dúvidas: a adolescência digital precisa ser superada.

"Estamos comemorando. Mas também estamos muito preocupados", disse o cientista, que voltou à cidade de Genebra nesta terça-feira para falar sobre os desafios de sua invenção aos cientistas do Cern.

Para ele, os últimos anos mostraram que a tecnologia precisa ter seu uso monitorado. "Ela pode ser incrível. Mas pode ser uma ameaça", alertou. "Um dia, podemos acordar e ver que houve uma revolução social. Mas também descobrir que a web promoveu uma teoria da conspiração que dominou um certo assunto", disse.

Nesta semana, Tim Berners-Lee publicou uma carta aberta em que ele defende um novo compromisso global. É o que ele chama de um "novo contrato" entre cidadãos, governos e empresas.

Com a nova iniciativa, ele tem dois objetivos. O primeiro é o de garantir que o restante da população mundial ainda sem acesso à rede possa ser atingida. "50% da humanidade está usando essa web. Agora, precisamos conseguir que o resto também possa ter acesso. Está cada vez mais injusto não dar essa garantia aos demais 50% do planeta", alertou.

Mas sua iniciativa também tem outro objetivo: consertar a Internet que já existe e que já conecta 50% do planeta. "Para aqueles que já tem acesso, temos de dizer: oopps. Não era a web que queríamos", admitiu.

Seu projeto é o de defender que a Internet continue aberta e livre. Mas que ela também saiba proteger a privacidade das pessoas, controlar os dados e limitar o discurso do ódio.

A ideia é de que, com base em princípios, a comunidade internacional refunde a Internet. Se aos governos será exigido que eles conectem toda sua população, esses mesmos estados precisam se comprometer em respeitar a privacidade de cada cidadão.

Já as empresas precisam se comprometer em reduzir os custos de conexão, além de lutar contra o uso da tecnologia por criminosos que poderiam se valer dela até mesmo para promover genocídios.

Berners-Lee, porém, quer também um compromisso dos usuários de que irão adotar um comportamento de respeito e um "discurso civilizado" na web. "As pessoas estão dando um passo para atrás, horrorizadas depois de Trump, do Brexit, e estão se dando conta que essa web que eles pensavam que era tão incrível de fato não está servindo a humanidade de forma tão positiva", reconheceu.

Para ele, a web é "o espelho da sociedade". Mas um novo código de redes sociais precisa ser escrito.

Berners-Lee, 30 anos depois de ter dado o primeiro passo de uma revolução, agora se lança numa "batalha" para salvar a web. "Essa é uma das causas mais importantes de nossa era", completou.

Sobre o autor

Com viagens a mais de 70 países, Jamil Chade percorreu trilhas e cruzou fronteiras com refugiados e imigrantes, visitou acampamentos da ONU na África e no Oriente Médio e entrevistou heróis e criminosos de guerra.Correspondente na Europa há duas décadas, Chade entrou na lista dos 50 jornalistas mais admirados do Brasil (Jornalistas&Cia e Maxpress) em 2015 e foi eleito melhor correspondente brasileiro no exterior em duas ocasiões (Prêmio Comunique-se). De seu escritório dentro da sede das Nações Unidas, em Genebra, acompanhou algumas das principais negociações de paz do atual século e percorre diariamente corredores que são verdadeiras testemunhas da história. Em sua trajetória, viajou com dois papas, revelou escândalos de corrupção no esporte, acompanhou o secretário-geral da ONU pela África e cobriu quatro Copas do Mundo. O jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparencia Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti.

Sobre o blog

Afinal, onde começam os Direitos Humanos? Em pequenos lugares, perto de casa — tão perto e tão pequenos que eles não podem ser vistos em qualquer mapa do mundo. No entanto, estes são o mundo do indivíduo; a vizinhança em que ele vive; a escola ou universidade que ele frequenta; a fábrica, quinta ou escritório em que ele trabalha. Tais são os lugares onde cada homem, mulher e criança procura igualdade de justiça, igualdade de oportunidade, igualdade de dignidade sem discriminação. A menos que esses direitos tenham significado aí, eles terão pouco significado em qualquer outro lugar. Sem a ação organizada do cidadão para defender esses direitos perto de casa, nós procuraremos em vão pelo progresso no mundo maior. (Eleanor Roosevelt)