Coerência, sr. presidente!
Bolsonaro chama Maduro de ditador, mas elogia Pinochet, Stroessner, Castelo Branco e Cia.
GENEBRA – Uma ditadura é uma ditadura. Ela pode ser de esquerda ou direita. Pseudo-religiosa ou laica. Mas todas tem em comum a falta de liberdade de um povo.
Nesta terça-feira, o presidente de um país democrático, Jair Bolsonaro, usou um evento em Itaipu para elogiar todos os presidentes do regime militar brasileiro e mesmo Alfredo Stroessner, o ditador paraguaio.
Ao falar da obra, ele indicou que "isso tudo não seria suficiente se não tivesse um homem de visão, um estadista, que sabia perfeitamente que seu país, o Paraguai, só poderia prosseguir, progredir, se tivesse energia. Aqui também a minha homenagem ao nosso general Alfredo Stroessner", disse.
No mesmo evento, ele ainda apontou João Figueiredo como "saudoso e querido", além de citar Castelo Branco e Médici.
Mas o paraguaio não foi o primeiro sul-americano a ser elogiado pelo brasileiro. Há alguns anos, Bolsonaro pediu, em telegrama enviado à Embaixada do Brasil no Chile, que fosse transmitida sua mensagem de solidariedade ao neto do general Augusto Pinochet, Augusto Pinochet Molina, após esse ter sido afastado do Exército por ter feito pronunciamento no sepultamento do avô.
Na mensagem, Bolsonaro afirma sua admiração por Molina não ter se curvado às "mentiras da esquerda" e fala do "saudoso" General Pinochet. O telegrama foi enviado à embaixada brasileira em 2006 e o pedido de Bolsonaro foi negado pelo Ministério das Relações Exteriores.
Em programa de TV do apresentador João Cleber, Bolsonaro disse que Pinochet "fez o que tinha de fazer".
Mais recentemente, durante o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, ele ainda dedicou seu voto a um torturador.
Nicolás Maduro lidera hoje um regime ditatorial, onde a democracia já foi asfixiada. Seu governo comete crimes, denunciados pela ONU. Mas se Bolsonaro opta por chamá-lo de ditador, terá de ser coerente ao tratar todos de forma igual e qualificar os demais líderes sul-americanos.
Ao se apresentar como alguém que irá "libertar o Brasil das amarras ideológicas", ele não tem o direito de amarrar o país a outro grupo: o de ditadores de direita.
Ao longo de anos, ataquei de forma insistente todas as vezes que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva votava na ONU ao lado de ditaduras. Foram votos vergonhosos de apoio à Coreia do Norte, ao Irã, a Cuba, ao Sudão e ao Sri Lanka, entre outros.
Nesta segunda-feira, na sede da ONU em Genebra, a ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves, garantiu em seu primeiro discurso internacional que o Brasil era guiado pelo estado de direito e democracia. Um dia depois, seu chefe presta homenagens a ditadores.
No ano 2019, é a vez de cobrar o atual chefe-de-estado uma postura coerente. Não, um presidente de uma democracia não tem o direito de prestar homenagem a um ditador.
Caso contrário, o que pensar de um presidente que olha para aqueles que suprimiram a democracia com admiração?
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